Silvia Cattori :
Quando se lê suas duas obras: La fin de l’État de droit. La lutte antiterroriste: de l’état d’exception à la dictature
e Global War on Liberty
[A guerra global contra a liberdade] [1] se comprende uma coisa que os responsáveis políticos querem ocultar-nos: que todas as medidas adotadas no marco da Lei Patriota [2] – apresentadas como se tivessem a ver com organizações terroristas – foram generalizadas e afetam de hoje em diante o conjunto dos cidadãos. Custa comprender que os Estados europeus tenham podido aprovar o abandono de sua ordem legal e submeter suas sociedades a essas leis de exceção.
Jean-Claude Paye: Não há nada, efetivamente, nos acordos europeus de extradição, assinados em 2003, que impeça que cidadãos europeus sejam levados perante jurisdições de exceção dos Estados Unidos. Temos que notar que esses acordos, que legitimam esses tribunais de exceção, são o resultado de anos de negociações secretas. Não constituem mais do que a ponta de um iceberg. Uma parte do texto relativo a esses acordos se fez visível porque devia ser ratificado pelo Congresso dos Estados Unidos.
Do lado europeu, não era necessário faze-los ratificar pelo Parlamenteo Europeu e os parlamentos dos Estados membros não tiveram nenhuma possibilidade de influir sobre o conteúdo dos acordos. Os que negociam no âmbito europeu são simples funcionários designados pelos diversos Estados membros.
Silvia Cattori : Mas, ao assinar esses acordos, o Conselho da Europa tem precipitado nossos países num universo kafkiano! Se esses acordos não foram retificados pelo Parlamento Europeu, por que foram aceitos?
Jean-Claude Paye: Não foram ratificados – o Parlamento Europeu tem só uma opinião consultiva- mas têm força legal. É um revelador da estrutura imperial que foi imposta. Pode se ver que a única estrutura estatal soberana que subsiste são os Estados Unidos. A União Européia, por exemplo, é uma estrutura totalmente desintegrada.
Silvia Cattori : Em que nível teve lugar essa negociação?
Jean-Claude Paye: Entre representantes do Conselho da Europa. Trata-se de funcionáriso que praticamente não têm que prestar contas. São delegados permanentes a cargo de assuntos de polícia e justiça, designados pelos Estados membros. São funcionários europeus ou nacionais que se convertem em satélites do governo dos Estados Unidos. Isso vale no plano judicial, e também no plano econômico.
Silvia Cattori : Portanto, a União Européia não se interessa pela proteção dos seus cidadãos. Isso tudo está fora de controle?
Jean-Claude Paye: Sim, evidentemente. Foi construída de modo que todo esteja fora do seu controle. Isso demonstra que a União Européia não é uma alternativa ao poder dos Estados Unidos. Ao contrário, está integrada nessa potência imperial, não é mais do que um simples repetidor [
3]
Antes de 11 de setembro de 2001, Estados Unidos negociava de modo bilateral. Então, receiava perante negociações com uma entidade como a Europa dos quinze porque sempre havia um Estado membro que não estava de acordo. Com os atentados de 11 de setembro, as coisas se aceleraram e simplificaram para os EUA. Segue negociando acordos bilaterais, mas agora trata também diretamente com a União Européia porque possui a relação de forças necessárias para que suas exigências sejam aceitas de entrada. Assim foi durante os acordos a respeito dos dados de vigilância das passagens aéreas. Um primeiro acordo havia sido assinado em 2004, depois um segundo em 2006 e um terceiro em 2007. Cada vez os EUA aumentaram suas exigências.
O acordo sobre os dados com referência aos viajeiros que vão aos EUA – que entrou em vigor em 29 de julho de 2007 – é um bom exemplo. Neste acordo, os europeus despojaram de sua substância todas as proteções legais, nacionais e européias, que existem em relação aos dados pessoais. São acessíveis 72 horas antes do embarque. As companhias aéreas devem transmitir o número de cartões bancários, o trajeto que se percorrerá nos EUA. Estes têm direito de impedir o acesso ao seu território, têm todos os direitos. Os cidadãos estrangeiros não são protegidos pelas leis dos EUA. Durante as negociações, Washington concedeu que se tratasse os europeus como cidadãos de EUA, mas se trata de um privilégio concedido pelo governo, que não tem a força da lei e que pode ser alterado pelo poder executivo.
Silvia Cattori : Já não há nada que se oponha ao estabelecimento de um sistema policial?
Jean-Claude Paye: Evidentemente! Os governos européus querem realizar o mesmo controle de nossas liberdades. As exigências dos EUA lhes apresentam a ocasião. Dizem: “Nos vemos obrigados a aceitar as exigências dos EUA porque do contrário as companhias europeas já não poderão seguir aterrissando lá.“ Comportam-se como se os Estados europeus não tivessem nenhum meio de retorsão e não pudessem, por seu lado, proibir que as companhias dos EUA aterrissem na Europa. Na prática, querem fazer o mesmo que o governo estadunidense. E existe o projeto de instaurar intercâmbios de informação similiares no âmbito europeu.
Silvia Cattori : Na Grã Bretanha, as leis “antiterroristas” permitem processar a toda pessoa que expresse pontos de vista considerados como suscetíveis de “criar uma atmosfera favorável ao terrorismo.” Podem estender-se essas leis a outros Estados?
Jean-Claude Paye: Sim, na Grã Bretanha, o governo Blair pode criminalizar através da lei toda forma de oposição radical à sua política exterior. No continente, os Estados tratam de atuar através da jurisprudência. Houve um processo muito interessante a respeito de militantes e simpatizantes do DHKPC na Bélgica, uma organização de oposição radical turca [
4], que demonstra como o poder trata de criar tribunais de exceção para introduzir uma jurisprudência de exceção. Através da criação destes tribunais, o poder trata de criminalizar toda forma de apoio, embora seja verbal, a grupos rotulados como “terroristas” pelos EUA, inscritos depois na lista européia de organizações “terroristas”.
Silvia Cattori : Resumindo, essas leis “antiterroristas” estabelecidas depois dos atentados de 11 de setembro de 2001, servem não só aos objetivos do governo Bush, como também aos dos governos europeus?
Jean-Claude Paye: As medidas das que falamos foram estabelecidas antes de 11 de setembro de 2001. A Lei Patriota reúne um conjunto de medidas que já existiam parcialmente. O objetivo da Lei Patriota não foi só impor as medidas adotadas, porém, dar-lhes legitimidade. O que era isolado, dispersso, está agora reunido numa lei só. O que outorga legitimidade às medidas que são adotadas.
Silvia Cattori : Pode-se deducir que os EUA precisavam de um gande atentado para impor esta modificação do direito penal?
Jean-Claude Paye: É óbvio! Temos que saber que a Lei Patriota, que foi apresentada três dias depois dos atentados, tem 128 páginas. O sistema penal dos EUA é complexo, funciona por referências. Isso quer dizer que uma lei modifica o conteúdo de outras leis penais. Se se toma o conjunto dessas modificações, isso corresponde a 350 páginas. Necessita-se pelo menos de um ano para redigir um texto semelhante.
Com respeito à União Européia, não é menos caricaturesco. As duas decisões marco – a relativa ás organizações “terroristas” e aquela relativa à ordem de arresto européia –foram apresentadas uma semana depois dos atentados. Também neste caso trata-se de textos que estavam prontos. Esperava-se a ocasião adequada para aprova-los.
Silvia Cattori : O que quer dizer que Bush desde 2001, e Sarkozy agora, podem utilizar esses procedimentos de exceção para transformar em inimigos a quem quiserem?
Jean-Claude Paye: Quando adotaram esses textos, já se tinha uma boa idéia de aonde poderiam levar. A lista de redes “terroristas” vem da União Européia. É estabelecida por um regulamento europeu de 2001. No meu livro “La fin de l’État de droit! [O fim do Estado de direito], menciono o caso de um comunista filipino, José Maria Sison, refugiado político reconhecido que havia obtido asilo político na Holanda. Inscrito na lista “terrorista” dos EUA, seu nome passou a ser inscrito na lista “terrorista” holandesa. O senhor Sison descobriu depois que estava inscrito na lista “terrorista” quando bloquearam suas contas e os expulsaram do alojamento social que lhe tinham asignado. Posteriormente, foi retirado da lista holandesa, mas como, entretanto, havia sido inscrito sobre a lista européia do Conselho, o governo holandês se serviu do pretexto de que o senhor Sison figurava sobre a lista “terrorista” européia, para manter as disposições que não podia justificar.
O interessante do caso é que, o 11 de junho de 2007, a Corte Européia de Luxemburgo anulou a decisão do Conselho de Europa. Estipulou que não existiam motivos para inscrever o senhor Sison na lista de “terrorismo” do Conselho que permite o bloqueio de contas.
O veredito estipula claramente que a ausencia de “motivos pertinentes” e o não respeito dos direitos de defesa levou à decisão de anular a decretação do Conselho de Europa.
No en tanto, em 28 de agosto, a policía holandesa voltou arrestar o senhor Sison, violando a decisão da Corte de Justiça.
Este caso é significativo das relações actuais entre a Justiça – que é a última instituição de resistência contra a concentração de poderes nas mãos do executivo – e a polícia. Isto demonstra que a polícia faz o que quer, violando as decisões da justiça.
Silvia Cattori :
Pareceria que começou a transcrição sobre a lista “terrorista” francesa dos decretos promulgados recentemente por George Bush que criminalizam às organizações e indivíduos que se opõem à política autal no Iraque e no Líbano. Uma lista de nomes que poderia ser publicado proximamente em conjunto pela França e os EUA. Quando foi votado em janeiro de 2006 pelo Parlamento na França o dispositivo legislativo relativo ao branqueamento [5] ninguém se imaginou que seria utilizado para atacar os opoentes políticos.
Jean-Claude Paye: Em cada país, existe uma lista interna de organizações “terroristas”. Em geral, trata-se da simples transcrição da lista do Conselho da Europa, à qual acrescentam elementos complementares.
Inteiro-me no que se refere ao Líbano. Parece que aqui acrescentaram elementos complementares sobre elementos da oposição no Líbano. Seria interessante saber se esses elementos vão ser integrados à lista do Conselho da Europa.
O que declara que alguém é “terrorista” não é um tribunal; é uma simples autoridade administrativa que te inscreve, sem que exista nenhuma explicação que justifique que te tenham colocado dentro dessa lista “terrorista.”
Silvia Cattori : Que lhe inspira isso tudo?
Jean-Claude Paye: Isto demonstra que quae todos os poderes se concentram atualmente nas mãos do executivo. Que o executivo possui atualmente poderes judiciais. O poder executivo é quem decide que se pode tomar tal ou qual medida na tua contra.
O ejemplo com respeito à oposição no Líbano e o exemplo de José Maria Sison, são exatamente o mesmo. Trata-se de decisões sem motivação. Com a ressalva de que, no caso do Líbano, há uma extensão, já que não basta com ser membro de uma organização que tem sido qualificada de “terrorista” para ser incriminado, mas, simplesmente ter contatos com seus membros. É uma tendência geral que prevalece no nível da aplicação das legislações “antiterroristas”.
Silvia Cattori : Por tanto, o objetivo da Lei Patriota y de ouras leis “antiterroristas”, é atacar as liberdades fundamentais?
Jean-Claude Paye: Sim, o objetivo é suprimir as liberdades fundamentais.
Silvia Cattori : Poderia se esperar que todas as forças políticas denunciaram essas norma de exceção. A esquerda, que se apresenta como defensora da justiça social, não deveria mobilizar-se, exigir que se volte de imediato ao Estdo de direito?
Jean-Claude Paye: A esquerda? Qual esquerda? Olha os EUA. Os demócratas votam em favor das leis mais liberticidas elaboradas pelo partido republicano. A Lei de Comissões Militares [MCA, em suas siglas em inglês], adotada em 2006, voi votada de modo igual por uma parte do partido democrata, que, no entanto, é majoritário na Câmara e que tinha a possibilidade de impedir que fosse aprovada essa lei.
Conosco é o mesmo. Não se vê a diferença com a direita quando a esquerda está no poder, à parte de uma aceleração, como é o caso com o presidente Sarkozy. Por exemplo, na França, as primeiras medidas de vigilância da Rede, medidas de vigilância global, foram estabelecidas pelo governo de Lionel Jospin.
O único poder que manifesta uma pequena resistência é o poder judicial. Nos EUA tem decretos adotados pelo executivo que são anulados. Por exemplo, quando a Corte de Cassação na Bélgica anula por vício de forma o juízo em apelação de militantes do DHKCP, é uma resistência ao aparato judicial. O problema é que não há nenhuma relevância na sociedade civil. Essa ausência de relevância se soma ao silêncio dos meios. Não se pode esperar que uma instituição isolada possa resistir durante muito tempo.
Silvia Cattori : Mas, é um ataque contra a liberdade de opinião que se estende ao mundo inteiro. Portanto, é fundamental que os partidos políticos se preocupem com essas desviações, e que os cidadãos saibam que essas leis permitem, sobre a base de uma simples suspeita, que se mantenha qualquer um na prisão sem acussação e sem processo; que já ninguém está protegido pela lei, que se trata de uma arbitrariedade total! Como se pode explicar que nos Foros Sociais, os “aaltermundistas”, os responsáveis de Attac, não coloquem esses temas no centro do debate?
Jean-Claude Paye: Não falaz nisso. Não querem falar. Isso toca problemas fundamentais. Não querem falar desses problemas porque deveriam afrontar diretamente o poder. Essas preocupações lhes são secundárias. Também não formam parte do programa de Attac. Falam da taxa Tobin, de coisas periféricas. Está-se numa sociedade psicótica, uma sociedade do não-enfrentamento.
Os que defendem os cidadãos nunca são os partidos que governam. Cada vez que os partidos aprovaram medidas favoráveis aos cidadãos, o fizeram porque havia uma relação de forças que os obrigava a fazê-lo. A democracia se conquista a-cada-dia, nunca é concedida.
Se se estudam e explicam as leis “antiterroristas” se despe exatamente a natureza do poder. Não se pode falar de poder democrático, se vê uma sociedade que já vai a caminho da ditadura. Se vê cada nova medida adotada é pior do que a precedente. As coisas estão muito claras. Mas se negam a vê-las tal como elas são.
O problema fundamental não é que o poder se trasnforme em ditadura, porque, como o demonstra a história, um poder incontrolável se converte sempre em ditadura. O problema fundamental da nossa época é a obrigação da gente ante esse processo. E isso constitui um fenômeno bastante novo. A gente entrega ao poder e à maquinaria econômica suas liberdades; e em última instância, levando em consideração os problemas ecológicos e climáticos, sua supervivência como espécie viva.
Silvia Cattori : Desde quando presentiu que as coisas se desenvolviam nesse sentido, e que se proibiria que se expresse a gente que critica o sistema político e mediático?
Jean-Claude Paye: De fim dos anos noventa. Nessa época já se via o estabelecimento deste Estado policial. Mas, as leis estabelecidas naquele então já parecem quase democráticas se comparadas com o que vemos agora. O processo vive uma forte aceleração.
Silvia Cattori : Isso significa que a autoridade ejecutiva dos EUA ataca diretamente os directos funamentais dos cidadãos do mundo inteiro, dentre eles os da União Européia?
Jean-Claude Paye: Sim, evidentemente! Mas, não se trata só do executivo estadunidense, senão do conjunto dos executivos do planeta entre os quais existe uma verdadeira solidariedade contra suas populações. As prisões secretas da CIA são um bom exemplo desse processo [
6]. No âmbito europeu, os governos têm sido diretamente integrados nesta organização da tortura. No melhor dos casos, tudo o que se pôde obter dos governos europeus é que se comportem como os três pequenos macacos: cegos, surdos e mudos [
7].
Sílvia Cattori : Que vai acontecer com os que estão inscritos nessas listas “terroristas” que continuam sendo mantidas em segredo?
Jean-Claude Paye: As listas “terroristas” não são todas secretas. No âmbito europeu, só a lista “Europol” é secreta. Permite que se tomem medidas de vigilância e o uso de técnicas especiais secretas de vigilância e de investigação com respeito a pessoas identificadas como “terroristas” [
8].
A lista do Conselho da Europa permite que se tomem medidas financieras, como o bloqueio de contas bancárias. Todos esse elementos serão utilizados se a relação de forças é favorável ao poder existente. O primeiro que há que fazer é revelar o que acontece, difundir o máximo de informações e fazer com que essas listas sejam conhecidas.
Silvia Cattori : Tudo isso não lhe sugere alguma analogia?
Jean-Claude Paye: Sim, com o clima dos anos trinta. Mas, atualmente se estabelece uma ditadura mundial. Uma espécie do “melhor dos mundos” e não um simples processo de “fascistização”.
Silvia Cattori : Desde 2001, seqÿestram-se pessoas, tortura-se a supostos “terroristas” de origem árabe e de confissão musulmana. Temos que esperar que amanhã se castigue os que denunciam esses abusos?
Jean-Claude Paye: O imperio necesita inimigos. Cria, inventa seus próprios inimigos.
O primeiro que há que se fazer é trazer à luz o que está oculto [
9]. Há tantas leis que permitem fazer qualquer coisa, quando se queira! Mas, isso se faz em função da resistência imediata dos interessados. Antes existia um marco legislativo que nos protegia. Agora, podem fazer qualquer coisa se têm capacidade de impô-la. Hoje em dia, as coisas repousam sobre uma simples relação de forças.
Silvia Cattori :
O senhor Dick Marty [10], nomeado pelo Conselho da Europa, poderá obter da União Européia a anulação destas leis ilegais?
Jean-Claude Paye: O informe que redigiu o señor Dick Marty é muito importante! Seu informe acerta o alvo, opõe-se à linha política dos governos europeus. Mas, na realidade, o senhor Marty não tem nenhum poder, seu informe não pôde mudar mudar nada porque vai na contracorrente. Porém, esse informe é essencial.
Silvia Cattori : Essas políticas que nos falam de justiça e liberdade, não são mais do que ar, nada?
Jean-Claude Paye: Temos que ser lúcidos: mostrar as coisas tais como são. Os que fazem críticas e se limitam a dizer: “Sim, temos que ter leis antiterroristas, é necessário lutar contra o terrorismo, mas há que evitar os abusos” não fazem outra coisa que legitimar o ponto de vista do poder. Há que mostrar que as leis que têm por objetivo a luta contra o “terrorismo”, são, na realidade, leis contras os povos.
A última lei promulgada nos EUA, a Lei de Comissões Militares, é uma lei constitucional de alcance mundial, como o demonstro no meu último livro “Global war on Liberty”. O presidente dos EUA tem a possibilidade de qualificar como inimigo a todo cidadão estadunidense ou a todo nacional de um país com o qual EUA não está em guerra. A gestão das populações, incluindo aos cidadãos estadunidenses, converte-se em um ato guerra e já não só em uma ação policial.
Tomemos o ejemplo do Acordo Swift. Swift é uma agência belga que se ocupa das transferências financeiras internacionais. Swift transmitiu desde 2001, todas as informações sobre as transações dos seus clientes violando não só a legislação belga, como a legislação européia [
11]. O direito dos EUA aplicado na Europa.
Todo o que diz o governo estadunidense é do domínio da fé. A tese governamental sobre os atentados de 11 de setembro, ninguém pode crê-la racionalmente. O informe da Comissão não indica sequer que foi derrubada a terceira torre. É um informe psicótico no qual o discurso do amo substitui os fatos em si. Uma recente sondagem da Zogby demonstra que a maioria dos estadunidenses deseja que se reabra a investigação. [
12] Enquanto que na Europa basta o fato de fazer perguntas para ser estigmatizado.
Silvia Cattori : Que mecanismo subsiste para exigir o retorno a um Estado de direito?
Jean-Claude Paye: Temos que deixar as coisas claras. Falar claro. Mostrar do que se trata. Depende da capacidade de resistencia da gente.
A luta “antiterrorista” é na realidade uma guerra contra as liberdades. Essa guerra contra as liberdades é a primeira etapa de uma guerra contra as populações. E a Lei de Comissões Militares é uma lei penal que tem carácter mundial e que, de fato, é um ato de soberania imperial. É uma lei que confunde relação policial e relação de guerra. É o estabelecimento de uma nova forma de Estado mundial que, ao integrar as funções de polícia e de guerra, lutas contra suas próprias populações.
Algo importante: esta lei se aplica no âmbito mundial, da possibilidade dos EUA, não só de seqüestrar, senão, sobretudo, de fazer entregar qualquer cidadão no mundo, quer dizer, a pessoas que tenha qualificado de “inimigos combatentes.”
Os acordos européus de extradição com EUA não se opõem a que as pessoas qualificadas de “inimigos combatentes” possam ser transferidas aos EUA. Portanto, é uma lei de alcance mundial. É um Ata constitutiva do Império.
Atualmente, o direito penal é constituinte. Isso já existiu na história de nossas sociedades. O direito penal exerce um papel constituinte nos períodos de transição (por exemplo, ao começo do capitalismo o direito penal foi dominante).
Se o directo penal é dominante atualmente é porque se prepara uma nova forma de direito de propriedade. É o que poderia ser chamado o fim da “propriedade de si próprio”. O conjunto de nossos dados pessoais tem deixado de nos pertencer. Pertencem ao Estado, e igualmente às firmas privadas. A dominação do direito penal prepara o estabelecimento desse futuro direito privado.
Silvia Cattori : A gente pensa geralmente que essas medidas afetam apenas a indivíduos determinados?
Jean-Claude Paye: Afetam a todo mundo. Afetam toda forma de resistência. Um “terrorista” chegou a ser alguém que não quer entregar suas liberdades ao poder, alguém que quer viver.
Silvia Cattori:
A partir deste verão (hemisfério norte), EUA cosideram como suspeitos de “terrorismo” os opoentes à sua política no Iraque e no Líbano [13]. O diretor da agência de imprensa libanesa New Oriente News, membro da Red Voltaire, já figura na lista. O governo Bush teria exigido ao gabinete de Sarkozy, que transcreva ao direito francês as novas listas de opositores políticos e que faça constar o jornalista Thierry Meyssan, quem já é pessoa non grata sobre território dos EUA. Surpreende-lhe este fato?
Jean-Claude Paye: Eu conhecia a exigência concreta de Bush a respeito de Thierry Meyssan. Mas, trata-se de um contexto de simples relação de forças num momento determinado. Quando se pensa na histeria que alguns chamados “intelectuais” franceses desenvolveram e nos ataques que Thierry Meyssan sofreu na França desde a aparição do seu livro sobre os atentados de 11 de setembro [
14] que ousava apresentar as perguntas que tinham que ser feitas, já nada nos pode surpreender.
Meu trabalho mostra que as disposições “antiterroristas” têm por objetivo atacar os opositores políticos assim como as populações e não só os “islamitas”. Portanto, não podemos nos surpreender fundamentalmente, si isso se comprova, perante uma possível inscrição de Thierry Meyssan nas listas “terroristas”. Porém, isso indicaria que temos passado a uma nova etapa na criminalização da palavra opositora. Isso indicaria que o poder se sente perfeitamente cômodo, colocando à luz, objetivos que sermpre tem negado até agora.
Quem pode acreditar a tese governamental sobre os atentados de 11 de setembro? Quem pode acreditar que uma torre alcançada por um avião caia de modo controlado? O problema é que os EUA dão todas as informações que permitem pôr em dúvida sua tese, e a gente simula que não acredita. Nos encontramos perante um mecanismo perverso, no qual o indivíduo, para não enfrentar a realidade, simula que acredita no inverosímil.
Silvia Cattori : Apesar de que Thierry Meyssan revelou fatos que haveria que levar a sério, surpreendentemente, os jornalistas o têm difamado.
Jean-Claude Paye: A quem pertencerm esses jornais que difamaram Thierry Meyssan? Esses “jornalistas” são pessoas que copiam o que lhes dizem que digam. Conhece a muitos jornalistas “oficiais” que verifiquem suas fontes e que façam um trabalho sério de investigação?
Silvia Cattori: Seus livros são importantes para todos os que defendem as liberdades.
Jean-Claude Paye: Escrevi esses livros porque acreditei que era necessário faze-lo. Quando vi que se aprovavam essas leis na Bélgica e por toda parte no mundo, tudo caminhava na mesma direção. Tinha que sublinhar essa coerência. Tem pouca gente que faça esse trabalho. Eu sou praticamente o único que trabalha de forma global. Todos esses dados não são coletados. Devo coletá-los, fazer o trabalho dos juristas e ao tempo, meu trabalho de sociólogo: poder pensar a nova forma de organização do poder. Meus trabalhos levam em conta os dois lados do Atlântico. Estudiam, não só as leis antiterroristas senão todas as leis de controle social. Isso forma um todo.