quarta-feira, 12 de abril de 2017

O Que Os Terroristas Norte Americanos E Europeus Querem Da Síria ! Por trás da guerra na Síria, a disputa do petróleo e do gás

Charge do Latuff (reprodução blog Novas Pensatas)
Pepe EscobarStrategic Culture Foundation
Síria é guerra por energia. Com o coração do assunto já exposto, mostrando feroz competição geopolítica entre dois gasodutos propostos, estamos diante da mais radical guerra no Oleogasodutostão – a expressão que criei há muito tempo para designar os campos de combate do Império no século 21.
Tudo começou em 2009, quando o Qatar propôs a Damasco construírem um gasoduto do Campo Norte Qatari – contíguo ao Campo Pars Sul, que pertence ao Irã – e que atravessaria Arábia Saudita, Jordânia e Síria diretamente até a Turquia, para abastecer a União Europeia.
Mas Damasco, em 2010, optou por outro projeto concorrente, o gasoduto Irã-Iraque-Síria, de $10 bilhões, também conhecido como “gasoduto islamista”. O negócio foi formalmente anunciado em julho de 2011, quando a tragédia síria já estava em andamento. Em 2012, foi assinado com o Irã um memorando de entendimento.
Até então, a Síria fora descartada, em termos geoestratégicos, porque não tinha nem petróleo nem gás em quantidades comparáveis às do CCG, o Clube do Petrodólar. Mas muita gente já sabia da importância da Síria como corredor regional de energia. E adiante essa posição foi reforçada, quando se descobriram reservas submarinas potencialmente muito consideráveis de petróleo e gás.
EXCITAÇÃO EUROPEIA
O Irã, por sua vez, é poderosa e conhecida usina de criação de petróleo e gás. Rumores persistentes em Bruxelas – ainda incapaz, depois de mais de dez anos, de produzir uma política unificada para a energia europeia – davam conta de excitação mal disfarçada em torno do gasoduto islamista: seria a estratégia perfeita para dividir (“diversificar”) os mercados ocupados pela Gazprom russa. Mas o Irã estava sob sanções relacionadas à questão nuclear, impostas por EUA e UE. Aquela questão acabou por se tornar motivo estratégico chave, pelo menos para os europeus, para produzir solução diplomática para o dossiê nuclear iraniano; um Irã “reabilitado” (para negociar com o ‘ocidente’) pode vir a ser fonte chave de energia para a UE.
Porém, do ponto de vista de Washington, persistia uma dificuldade geoestratégica: como quebrar a aliança Teerã-Damasco? De fato, afinal, como quebrar a aliança Teerã-Moscou?
A obsessão de Washington com “Assad tem de sair” é hidra de muitas cabeças. Inclui quebrar a aliança Rússia-Irã-Iraque-Síria (hoje ativada como aliança desses 4 ‘mais um’, já incluindo também o Hezbollah que combate contra todos os ramos do jihadismo salafista na Síria). Mas também inclui interromper qualquer coordenação de energia que haja entre aqueles países, para beneficiar os clientes/vassalos do petrodólar do Golfo, todos esses associados às majors norte-americanas de energia.
IMPÉRIO DO CAOS
Por tudo isso, até agora a estratégia de Washington consistiu em injetar na Síria a maior quantidade possível da proverbial lógica do Império do Caos: alimentar quaisquer chamas de caos interno, operação pré-planejada por CIA, Arábia Saudita e Qatar, com culminação prevista sob a forma de mudança de regime em Damasco.
Para Washington, qualquer óleogasoduto Irã-Iraque-Síria é inaceitável, não só porque tira negócios e fregueses dos EUA, mas sobretudo porque, na guerra das moedas, esses negócios atropelarão o petrodólar: o gás iraniano do campo Pars Sul pode ser negociado numa cesta alternativa, de outras moedas.
Acrescente a isso tudo a noção distorcida, mas fundamente implantada em Washington, de que esses oleogasodutos significariam controle ainda mais amplo, pelos russos, do fluxo de gás que parte do Irã, do Cáspio e da Ásia Central. Perfeito nonsense. A Gazprom já disse que até se interessaria em alguns detalhes do projeto, mas que o projeto propriamente dito é essencialmente dos iranianos. De fato, esse gasoduto será uma alternativa à Gazprom.
Mesmo assim, a posição do governo Obama sempre foi “apoiar” o gasoduto do Qatar “como forma de equilibrar o Irã” e ao mesmo tempo “diversificar as fontes europeias de suprimento de gás, afastando uma da outra Europa e Rússia.” Nesses termos, ambos, Irã e Rússia, foram configurados como “o inimigo”.
TURQUIA NA ENCRUZILHADA
O projeto do Qatar, liderado pela Qatar Petroleum, conseguiu seduzir europeus variados, como se deveria esperar que conseguisse, se se considera a vasta pressão que os poderosos lobbies pró-EUA e Qatar aplicaram nas principais capitais europeias. Os dutos recobririam parte de uma conhecida ópera do oleogasodutostão, o já defunto projeto Nabucco, que tivera sua base de operações em Viena.
Assim, implicitamente, desde o início, a UE sempre realmente apoiou o serviço de derrubar o governo de Damasco – serviço que, até agora já pode ter custado a Arábia Saudita e Qatar pelo menos $ 4 bilhões (e aumentando). Foi esquema muito semelhante à jihad afegã nos anos 80: árabes financiando e armando uma gangue multinacional de jihadistas & mercenários ajudados por um intermediário estratégico (o Paquistão no caso do Afeganistão, a Turquia no caso da Síria). Diferente, só, que a luta agora seria travada contra uma república árabe secular.
Foi luta muito mais dura, é claro, com EUA, Reino Unido, França e Israel superturbinando cada vez mais todas as variantes de agentes clandestinos que privilegiam rebeldes ‘moderados’ e também os demais, sempre com vistas a derrubar o governo de Assad (‘mudança de regime’).
MUITO GÁS
Agora o jogo expandiu-se ainda mais, com a recente descoberta de muito gás em reservas marítimas por todo o Mediterrâneo Oriental – em águas territoriais de Israel, Palestina, Chipre, Turquia, Egito, Síria e Líbano. Toda essa área pode guardar coisa como 1,7 bilhão de barris de petróleo e talvez 122 trilhões de pés cúbicos de gás natural. Seria simplesmente um terço de toda a reserva ainda não revelada de combustível fóssil que se calcula que haja em todo o Levante.
Do ponto de vista de Washington, o jogo é claro: tentar isolar o mais completamente possível: de um lado Rússia, Irã e uma Síria ‘sem mudança de regime’; e de outro a nova bonanza de energia que brota do Mediterrâneo Oriental.
É o que nos traz à Turquia – agora já na linha de fogo de Moscou, depois da derrubada do SU-24 russo. A ambição de Ancara, na verdade, uma obsessão, é posicionar a Turquia como principal ponto de entroncamento das principais rotas de energia para toda a UE.
A Turquia desempenha o papel de encruzilhada chave para a energia, no projeto do oleogasoduto do Qatar. Mas é sempre importante não esquecer que esse oleogasoduto do Qatar não precisa cruzar Síria e Turquia. Pode facilmente cruzar Arábia Saudita, o Mar Vermelho, o Egito, e chegar ao Mediterrâneo Oriental.
Assim sendo, no Grande Quadro, do ponto de vista de Washington, o que mais importa, vale repetir, é “isolar” o Irã, da Europa. O jogo de Washington é privilegiar o Qatar como fonte, não o Irã; e a Turquia como entroncamento, para que a UE afaste-se (‘diversifique’) da Gazprom Russa.
O que é certo é que, geoeconomicamente, a Síria é problema muito mais complexo que alguma ‘guerra civil’ que não existe. É feroz disputa por poder no Oleogasodutostão, sobre um tabuleiro de xadrez vertiginosamente complexo, na qual o Grande Prêmio será vitória das grandes, nas guerras por energia do século 21.
(artigo enviado por Sergio Caldieri, tradução de Coletivo Vudu)

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