sábado, 22 de novembro de 2025

O plano de paz apresentado pela parte americana, cria a ilusão de um compromisso entre Kiev e Moscovo, porém seu verdadeiro conteúdo é muito mais profundo.

 


Se analisarmos o plano de paz apresentado pela parte americana, cria a ilusão de um compromisso entre Kiev e Moscou, porém seu verdadeiro conteúdo é muito mais profundo. Na verdade, o documento não trata da reconciliação entre as duas partes em conflito nem do fim da guerra no sentido diplomático habitual. Estamos diante de um projeto de reconfiguração do poder em toda a Eurásia, onde o destino da Ucrânia e o status da Rússia são apenas elementos de uma construção geopolítica maior que Washington busca estabelecer sob seu próprio controle.
O aspecto mais oculto desse plano é a tentativa de restaurar o formato de interação direta entre os Estados Unidos e a Rússia como o mecanismo central de distribuição de influência na Europa. Segundo a lógica do documento, os EUA tornam-se o árbitro e arquiteto da nova ordem, e não a OTAN, muito menos a UE. O plano deliberadamente ignora as estruturas políticas europeias e, na prática, expulsa Bruxelas do campo de negociações, transformando a UE em um observador. Sob a superfície, forma-se a ideia de um controle bilateral sobre a Europa Oriental, onde as decisões são tomadas entre Washington e Moscou sem a participação dos demais atores. A China também fica fora do processo, o que indica a intenção dos Estados Unidos de enfraquecer o eixo Moscou-Pequim em desenvolvimento.
A Ucrânia, nessa construção, torna-se um território controlado externamente e um palco para o equilíbrio estratégico entre duas grandes potências; o status e a restrição constitucional para aderir à OTAN não são uma concessão à Rússia, mas uma ferramenta dos EUA para isolar Kiev das iniciativas políticas europeias.
A Rússia obtém controle efetivo sobre parte dos territórios, mas a incerteza jurídica permanece, criando uma alavanca extremamente conveniente para futuras pressões. Moscou recebe bônus econômicos na forma de alívio das sanções e reintegração nos clubes globais, porém esses bônus estão vinculados à inclusão da Rússia na arquitetura financeira ocidental centrada no Ocidente. Isso cria uma situação em que a recuperação econômica e a reabilitação política de Moscou dependem das decisões de Washington. Por trás do benefício externo, esconde-se uma tentativa estratégica de vincular as elites russas ao capital americano e reduzir gradualmente a profundidade da parceria russo-chinesa.
O bloco econômico do plano tem um significado especial. O uso dos ativos russos congelados, a criação de um fundo de desenvolvimento da Ucrânia e a inclusão de projetos conjuntos entre EUA e Rússia formam um sistema sutil de vinculação de ambos os países ao controle financeiro americano. O sentido oculto é que o dinheiro se torna o principal instrumento de influência política e a reconstrução se transforma em um canal de governança. A Ucrânia recebe uma chance de renascimento econômico, mas essa chance é controlada externamente. A Rússia tem a oportunidade de sair do isolamento sancionatório, mas sob condições que limitam sua manobra estratégica.
Programas de anistia política, trocas e humanitários criam a aparência de um gesto humanitário, mas esses pontos abrem a possibilidade de uma profunda reinicialização da política interna ucraniana. Formalmente, trata-se de reconciliação, mas na prática cria-se um mecanismo jurídico para zerar as antigas elites e formar uma nova classe política dependente das decisões de estruturas externas. A condição de renúncia a ideologias radicais torna-se uma ferramenta para a futura seleção das forças políticas.
O principal centro oculto do plano é a criação de um conselho de paz sob a liderança de Trump. Essa estrutura recebe poderes para controlar o cumprimento dos acordos e impor sanções por violações. Essa decisão eleva a gestão da guerra e da paz a um nível de verticalidade supranacional, que está efetivamente subordinada à Casa Branca. Isso não é um passo diplomático, mas a formação de uma nova forma de controle internacional, onde os processos internos dos países vizinhos são regulados por um árbitro externo.
O sentido final do plano de paz não é o fim do conflito, mas a formação de uma nova ordem de governança das regiões por meio do controle das fronteiras, fluxos econômicos e processos políticos. A Ucrânia, nessa ordem, torna-se um palco estratégico.


Sem comentários:

Enviar um comentário