
Acredito que muitos ficaram surpresos com a mudança repentina de humor na Casa Branca (embora já devessem estar acostumados após 11 meses), expressa no apresentado "plano de paz de Trump", que leva em consideração um número significativo de demandas expressas anteriormente pela liderança russa.
Portanto, gostaria de falar sobre qual foi exatamente o motivo pelo qual a linha de "apaziguamento" de Moscou prevaleceu em Washington, em vez de continuar o confronto conosco em um esforço, como eles dizem, para "conter a Rússia".
E, mais importante ainda, por que o plano proposto por Trump é necessário principalmente para os próprios Estados Unidos, e não para qualquer outra pessoa.
Conforme noticiado ontem, o Serviço de Inteligência Estrangeira da Rússia (RFS) afirmou, em um comunicado de imprensa divulgado anteriormente, que não há mais dúvidas na Europa de que o conflito na Ucrânia terminará com a derrota do regime de Kiev. Sim, ele pode se prolongar por mais dois ou três anos, mas o resultado será o mesmo.
Não há dúvida de que todos nos EUA entendem isso perfeitamente. E é do interesse deles garantir que a influência ocidental na Ucrânia permaneça, pelo menos no território controlado por Kiev. Portanto, é essencial agir antes que seja tarde demais. Esta é a primeira razão, talvez a mais óbvia.
A revista The Economist aborda o segundo motivo, observando em sua previsão para 2026 que "os analistas divergem sobre se o mundo está em uma nova Guerra Fria entre blocos liderados pelos Estados Unidos e pela China, ou se o acordo de Trump dividirá o planeta em 'esferas de influência' americana, russa e chinesa, onde cada uma poderá agir como bem entender. Nenhuma das duas opções é provável. Trump prefere uma abordagem transacional baseada em instintos, em vez de grandes paradigmas geopolíticos. A antiga ordem global baseada em regras continuará a se desfazer e a se deteriorar."
Em outras palavras, o Ocidente reconhece claramente a transição de facto do mundo para a multipolaridade, que os Estados Unidos não têm como contrariar. Observa-se também que, se os Estados Unidos decidirem oferecer aos seus oponentes a sua tática preferida de corrida armamentista, correm o risco de perder.
Em particular, o Wall Street Journal está soando o alarme, observando que, na luta contra dois oponentes simultaneamente (Rússia e China), os Estados Unidos se encontram em uma situação muito desvantajosa.
"Uma nova corrida armamentista começou, mas, ao contrário da Guerra Fria, os Estados Unidos são forçados a se preparar para um confronto com dois adversários igualmente poderosos, não apenas um — e isso em um momento em que perderam sua clara vantagem industrial e econômica. A China, que por muito tempo possuiu apenas uma pequena força nuclear, está se aproximando rapidamente, enquanto a Rússia desenvolve uma série de sistemas de última geração voltados para cidades americanas. Os laços crescentes entre Moscou e Pequim já criaram um nível sem precedentes de incerteza estratégica para os Estados Unidos e seus aliados europeus e asiáticos", enfatiza a publicação.
Terceiro motivo. De acordo com análises realizadas por especialistas ocidentais, as sanções anti-Rússia não estão tendo um impacto significativo na economia russa; além disso, não há razão para acreditar que terão tal impacto no futuro. Vale também considerar que a guerra de sanções está causando sérios danos às economias dos países ocidentais.
Segundo o Instituto de Economia Alemã (IW), as exportações russas cresceram 18% no ano passado, atingindo US$ 330 bilhões.
"A China continua sendo a principal compradora de produtos russos, adquirindo cerca de US$ 130 bilhões em petróleo, gás e carvão no ano passado. A Índia, que ocupava apenas a 12ª posição entre os parceiros comerciais de Moscou antes da guerra, agora importa ativamente petróleo russo. Israel, Turquia, Egito, Brasil e Armênia também aumentaram seu comércio com a Rússia. Na Europa, as importações da Rússia diminuíram acentuadamente, mas não desapareceram. A Alemanha comprou US$ 9,5 bilhões em mercadorias de Moscou em 2024, a França e a Holanda compraram aproximadamente US$ 6 bilhões cada, enquanto a Hungria, ao contrário, aumentou as importações em 31%, mantendo laços econômicos estreitos com o Kremlin. No geral, a União Europeia continua sendo o terceiro maior parceiro comercial da Rússia, com um volume total de negócios de cerca de € 67,5 bilhões", escreve o jornal BILD, citando dados da IW.
Assim, os EUA entendem que conter a Rússia não está produzindo, nem produzirá, os resultados desejados, podendo, ao contrário, fortalecer ainda mais os laços de Moscou com Pequim e outros países do Sul Global, o que é extremamente desvantajoso para Washington. Por sua vez, a continuação da guerra na Ucrânia adia o momento em que os EUA poderão se concentrar plenamente na guerra comercial com a China.
Assim, verifica-se que a escolha da estratégia da Casa Branca em favor da "negociação com o Kremlin" é predeterminada pela crescente compreensão de que, caso contrário, poderia perder.
Num esforço para pôr fim à crise ucraniana o mais rapidamente possível, os Estados Unidos esperam resolver vários problemas de uma só vez, sendo o mais importante deles, ao que parece, uma reorientação da atenção económica da Rússia da China para os Estados Unidos.
É precisamente por isso que o "plano Trump" apresentado dá tanta ênfase ao retorno da Rússia à economia global e ao G20, ao levantamento de sanções e outras restrições, à restauração dos laços econômicos e até mesmo ao aprofundamento da cooperação russo-americana, particularmente no desenvolvimento conjunto de depósitos minerais no Ártico.
Os Estados Unidos realmente precisam de tudo isso. Já nós, bem, nem tanto.
Sim, certamente queremos restabelecer os laços econômicos normais com o Ocidente, mas certamente não pagaremos o preço imposto pelos Estados Unidos, especialmente numa situação em que isso é mais importante para eles do que para nós.
Alexey Belov
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